17 de agosto de 2010



Conheço em mim uma imagem muito boa, e cada vez que eu quero eu a tenho, e cada vez que ela vem ela aparece toda.

É a visão de uma floresta, e na floresta vejo a clareira verde, meio escura, rodeada de alturas, e no meio desse bom escuro estão muitas borboletas, um leão amarelo sentado, e eu sentada no chão tricotando.

As horas passam como muitos anos, e os anos se passam realmente, as borboletas cheias de grandes asas e o leão amarelo com manchas - mas as manchas são apenas para que se veja que ele é amarelo, pelas manchas se vê como ele seria se não fosse amarelo.

O bom dessa imagem é a penumbra, que não exige mais do que a capacidade dos meus olhos e não ultrapassa minha visão.

E ali estou eu, com borboleta, com leão. Minha clareira tem uns minérios, que são as cores. Só existe uma ameaça: é saber com apreensão que fora dali estou perdida, porque nem sequer será floresta ( a floresta eu conheço de antemão, por amor), será um campo vazio ( e este eu conheço de antemão através do medo) - tão vazio que tanto me fará ir para um lado como para o outro (...) Para falar a verdade nunca estive tão bem.

Cada um de nós está em seu lugar, eu me submeto bem ao meu lugar. Vou até repetir um pouco mais porque está ficando cada vez melhor: o leão amarelo e as borboletas caladas, eu sentada no chão tricotando, e nós assim cheios de gosto pela clareira verde.

Nós somos contentes.

Clarice Lispector

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