24 de outubro de 2010

Vamos coletar ossos, Amor...

Aqui, membros suspensos de mim cantam pedras.

Trocamos gritos nas estrofes, gritos ásperos, como se quiséssemos socar as nossas orelhas…
Fizemos do desespero um aprisionamento e marchamos em direção ao absurdo… gostamos de tudo que é absurdo e que nos tire desse lugar-comum em que confortavelmente você boceja e sonha escondido com medo dos olhos alheios. Você tem medo do julgamento e nós… não.

Vamos mais adiante, eu e os membros que cantam, correndo entre as pedras, as estátuas, os corpos em decomposição que jazem aos ecos dos brados da vontade de uma vitória que não mais alcançarão… à direita de Deus-Pai um homem estranho me olha como se a minha alma fosse suja como a dele… ele enxerga meus pecados e vê a eminência da morte que me persegue… mas não me alcança.

Quanta decadência há em viver obrigatoriamente sempre reparando as rachaduras do meu corpo… evitando que ervas brotem nas frestas, evitando que flores surjam entre meus miolos cansados… nós ainda temos muito a cantar... continuemos!

Lembra-se daquela música que eu lhe disse ser a mais linda que já tinha ouvido? Passamos – eu e os membros -, semanas ouvindo-a… ouvimos tanto que a transformamos em eterna… um código, um hino... imaginamos mil formas de dançá-la… que vergonha, Deus! E eu não sei se sei dançar!

Minha família não ouve a música… nem a que cantamos nem a que ouvimos e nós, eu e os membros do meu corpo, vamos sair pra nova guerra: catar os ossos dos companheiros mortos no combate de ontem. Vamos seguir os abutres! Sintam o olor das carnes podres que convidam-nos ao banquete! Juntemo-nos aos de asas negras! Louvemos o sangue derramado e gritemos lindas palavras de agonia! Salve os nossos mortos que morreram por não saber cantar!

Eles não têm coragem de abrir os olhos, então, serão divinamente devorados por nós…

Por trás do meu ombro, percebo chegar a Luz que me assusta… onde há trevas me escondo com mais dificuldade… e eu também sou luz… não há lugar confortável como onde você se deita… deitamos nosso corpo – meu e dos membros -, nos espinhos quebrados pelos beiços dos plebeus que por aqui ceiaram ontem… e somos nós, eu e os membros, plebeus também… mas somos dignos porque cantamos, porque choramos, porque gritamos e porque dançamos… lindo ou não, mas não tememos… e por enquanto, isso nos torna nobres de alma e coração.

Somos invejados por aqueles que não sabem enxergar. Odiados por aqueles que não sabem cantar… repelidos por aqueles que não têm coragem… criticados por aqueles que não souberam e não sabem amar. Perseguidos por quem não sabe dançar. Amaldiçoados por quem não sabe navegar. Amados pelos que nos acompanham nos dias de caça aberta pois só estes sabem o som da nossa voz e o perfume que exala das nossas palavras agônicas, almáticas e ferinas!

Há dias meu útero cresce várias pessoas… tantas que já perdi a conta! Deus meu… dai-me a coragem de aguentar-me! Dai-me a Tua luz para que eu não me perca de mim mesma e dai-me a sabedoria e astúcia para que eu saiba sobreviver à luta que logo travarei comigo mesma!

Veja, companheiro… as bocas mastigam somente o que é rígido e duro de engolir… afiam as presas para que sejam dilacerados os corpos macios e táteis das pedras que cruzam nossos caminhos!

Juntai-se a nós! Não tenha medo dos meus olhos e nem dos meus dedos… jamais te faria mal… não a ti! Olho-te assim porque necessito dessa paz que escondes atrás do peito rasgado pelas rajadas da Vida… mas te peço que não vire as costas a mim… eu não saberia reagir ante o hálito morno que exala da tua nuca depois que te beijo em cio… Gosto de amar teu corpo como um animal que sou e desmaiar em teus braços quando termina meu sorriso largo e cego… Busco alcançar tua essência por dentro da tua boca mas a língua não a alcança… ainda…

Sinta como o canto petrifica-nos a excessiva coragem! Convida-me a parar… raramente meus pés e olhos param… a não ser quando lhe beijo faminta, sedenta… louca pra arrancar-lhe das tripas o resto do ar primeiro que respiraste na vida.

Não há tempo! Temos uma guerra começada e tudo que temos a fazer agora é alcançar, assassinar e decapitar os inimigos… roubar-lhes as cabeças dos seus corpos… pendurá-las em nosso pescoço – quantas pudermos e couberem -, tomar-lhes o sangue e comer-lhes as carnes … Não há tempo pra amar quando canto após essa comilança… Contudo, ainda não somos tão maus… somos?

Apesar de cantarmos e gritarmos barbaramente, somos crianças e colhemos flores! E rimos… e choramos quando preciso, mas pouco: não há muito a chorar por aqui… Procuramos atrás dos muros das escolas, onde se escondem os homens que deveriam desposar as meninas virgens que os esperam virtuosamente brancas ao lado da estátua de sal… Já não há mais guerreiros para cruzarem com essas meninas virgens… vagamos semanas à leste, norte, oeste e sul… sentamo-nos ao centro e não encontramos esses seres… o fim está próximo: elas não mais gerarão semi-deuses… estamos fadados a sermos órfãos de heróis e aventuras que nos encoragem a desejar a liberdade que somente as ondas batendo em nosso navio sabem traduzir esse sentimento…

Vamos ser ingênuos, por favor… E por favor, não tenham esperança, esse sentimento vil, biltre e infâme que nos contamina os ânimos quando precisamos seguir! Não há cá, espaço pra esperança… nós cavamos o que precisamos e queremos… não esperamos que caia da providência uma solução que nos seja favorável… quando não nos alegra, nós – eu e os membros de mim -, exterminamos a fonte da nossa chuva de bosta…

Sinta… sinta como nossas crianças não sabem mais brincar! Ensinaremos, então, como se brinca nos dias de coletar ossos! Ensinaremos, então, como cantar nos dias de tomar sangue! E ensinaremos às crianças, como dançar a nossa música que ficou esquecida dos outros ouvidos contaminados pela podridão da humanidade…

Vem, Amor… podemos abocanhar e ferir tudo que não se pode classificar! Nossos filhos serão mais fortes e guerreiros quanto mais sangue e carne nos alimentar! Vem, Amor… é a última vez que te chamo a vir comigo desbravar carniças, rolar e cavar leitos, beber oceanos, cavalgar ventos… talvez, dessa próxima viagem, eu não mais te veja se não vires comigo… de qualquer forma, guarda em teus ouvidos as palavras que neles deitarei:
- sempre te amei… e sempre te amarei… nunca deixes de acender aquela vela pra mim, na janela, no canto direito, pra que eu não me perca de ti se chegar na escuridão noturna do teu quintal… aprende a minha música, Amor… cante-a pra mim que ouvirei teus ecos nos cantos do mundo, onde quer que eu esteja… eu te amo tanto quanto amo aquela música primeira que te cantei um dia… lembra de mim como se lembra dessa música nossa… amo-te do tamanho da angústia dessa partida até a chegada dessa nova guerra... amo-te do tamanho da saudade que sinto de estar nos teus braços quando cantas pra mim essa nossa música solene, eterna, terna… como eu te amo!
Ândrea Mamontow, A Russa. 24 de outubro de 2010…

23 de outubro de 2010

A esperança, por Nietzsche...

Pandora trouxe o vaso que continha os males e o abriu.
Era o presente dos deuses aos homens, exteriormente um presente belo e sedutor, denominado "vaso da felicidade". E todos os males, seres vivos alados, escaparam voando: desde então vagueiam e prejudicam os homens dia e noite.
Um único mal ainda não saíra do recipiente: então, seguindo a vontade de Zeus, Pandora repôs a tampa, e ele permaneceu dentro. O homem tem agora para sempre o vaso da felicidade, e pensa maravilhas do tesouro que nele possui; este se acha à sua disposição: ele o abre quando quer; pois sabe que Pandora lhe trouxe o recipiente dos males, e para ele o mal que restou é o maior dos bens - é a esperança.
Zeus quis que os homens, por mais torturados que fossem pelos outros males, não rejeitassem a vida, mas continuassem a se deixar torturar. Para isso lhes deu a esperança: ela é na verdade o pior dos males, pois prolonga o suplício dos homens.

Friedrich Nietzsche, "Humano, demasiado humano", Cia. das Letras, p.63, aforismo 71, SP, 2001.

4 de outubro de 2010

Cada história tem a sua versão...

Duas mulheres conversando:

- Como foi sua transa ontem?
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1ª - Uma catástrofe! Meu marido chegou do trabalho, jantou em 3 minutos, depois tivemos sexo durante 4 minutos e após 2 minutos, ele já estava dormindo! E sua transa, como foi?
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2ª - Foi fantástica! Meu marido chegou em casa levou-me para jantar e depois passeamos à pé, durante 1 hora até voltarmos para casa. Após 1 hora de preliminares à luz de velas, fizemos sexo durante 1 hora e, no fim, ainda conversamos durante mais 1 hora!

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Os dois maridos conversando:

- Como foi tua trepada ontem?

1º - Foi fantástica! Cheguei em casa e o jantar estava na mesa; jantei, dei uma rapidinha e dormi feito pedra! E a sua?
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2º - Uma catástrofe! Cheguei em casa e não havia luz porque esqueci de pagar a última conta. Tive que levar minha mulher para jantar fora. A comida foi uma porcaria e caríssima, tão cara que fiquei sem dinheiro para pagar o táxi de volta. Não tivemos outra alternativa senão ir a pé para casa. Chegamos em casa e como não tínhamos eletricidade, fomos obrigados a acender velas! Eu estava tão stressado que precisei de 1 hora até que o bicho ficasse duro e uma hora até conseguir gozar. Foi de tal maneira irritante que não peguei no sono durante 1 hora, e fui bombardeado pela minha mulher com uma infindável conversa fiada....


Recebi esse texto do amigo Francisco de Paula Souza.


Eu não sei se ele compartilha dessa segunda versão (será? rss) mas é notório que os homens, em sua maioria, pensam exatamente dessa maneira. Em contrapartida, nós, mulheres, pensamos exatamente a primeira versão! rsss