23 de outubro de 2010

A esperança, por Nietzsche...

Pandora trouxe o vaso que continha os males e o abriu.
Era o presente dos deuses aos homens, exteriormente um presente belo e sedutor, denominado "vaso da felicidade". E todos os males, seres vivos alados, escaparam voando: desde então vagueiam e prejudicam os homens dia e noite.
Um único mal ainda não saíra do recipiente: então, seguindo a vontade de Zeus, Pandora repôs a tampa, e ele permaneceu dentro. O homem tem agora para sempre o vaso da felicidade, e pensa maravilhas do tesouro que nele possui; este se acha à sua disposição: ele o abre quando quer; pois sabe que Pandora lhe trouxe o recipiente dos males, e para ele o mal que restou é o maior dos bens - é a esperança.
Zeus quis que os homens, por mais torturados que fossem pelos outros males, não rejeitassem a vida, mas continuassem a se deixar torturar. Para isso lhes deu a esperança: ela é na verdade o pior dos males, pois prolonga o suplício dos homens.

Friedrich Nietzsche, "Humano, demasiado humano", Cia. das Letras, p.63, aforismo 71, SP, 2001.

Nenhum comentário: