26 de agosto de 2010

sobre ela e outras elas... eles. Nós?

Seus olhos se entristeceram perto das 17 horas.

Logo depois, saíra do seu trabalho com um tipo de aflição diferente das aflições costumeiras.
Trocou o trajeto de ônibus por uma longa caminhada. Não ousou romper o silência que aumentava dentro dela com música.

Deixou que suas pernas a levassem para casa.

Parava quando os semáforos a obrigavam. Caminhava com destino certo mas de uma forma como se caminhasse para o desconhecido.

Ainda teve tempo de ver, no fim da larga avenida, o sol se por para dentro do asfalto morno.
Era inverno.

O por do sol no inverno tinge o céu de dor. Tudo se avermelha, se alaranja, se escurece em nuances de diferentes profundidades de azuis, mesclados com as cores das dores todas.
Continuou.

Estava perto de casa, agora...

Entrou silenciosamente e, mesmo que não fosse dessa forma, ninguém repararia que havia um corpo estranho retornando à casa.

Comeu algo...
Foi pro banheiro...

Durante o banho, deixava a água tentar limpar um resto de si que estava impregnado. Esfregou a esponja contra o corpo como se quisesse arrancar-se dali.
Enrolou-se na toalha e saiu deixando pegadas molhadas pelo caminho.

Sentou-se na cama até recostar-se nos travesseiros. Adormeceu.

Pensou ter ouvido o telefone tocar e acordou assustada, sabia que alguém estava ligando para ela.

Correu até a metade do quarto quando se deu conta de que não ouvira nada. Ele não ligara para ela. Ele nem se importava se ela havia tido ou não um dia gostoso, se tivera alguma alegria para contar-lhe, se sentira saudade ou saudades. Ele nem se preocupou em saber se ela apenas estava viva.

Ela estancou no escuro daquele espaço. Voltou-se para o armário. Chorava. Arrumou a roupa que iria trabalhar no dia seguinte, tudo numa organização frenética. Pegou uma calcinha da gaveta e vestiu-a olhando-se no espelho. Admirou-se por um instante.

Achou algumas irregularidades que só uma mulher sabe em que ponto achá-las.
Não escovou os cabelos ainda molhados.

Olhou pela fresta da janela. A rua estava ali, parada como sempre estivera.

Pensou em si. Pensou na rua. Nas pessoas que deveriam estar ali, mas que por vários motivos desconhecidos, não estavam. Na verdade, ela não queria admitir que tanto ela, a rua, as ruas todas, as outras pessoas, as casas, os carros - tudo, era solitário e abandonado como ela.

Rezou, mas pediu tanto - sempre a mesma coisa, que eu duvido que Deus tenha saco para tanto...
Ela teve pena de si mesma e da desgraça que eram seus dias, suas noites, sua vida toda, como se somente ela fosse um erro, um grande erro no mundo.

Desistiu de se lamuriar. Parece que, num instante, se deu conta - novamente -, de que Deus ou o mundo ou todo o universo não tinham qualquer solução pra suas dores, aflições e solidões. Ainda antes de dormir, teve um último pensamento lúcido: quantas pessoas além dela, estavam apreciando ou sendo apreciados pelo mesmo sentimento de aflição, de angústia, de abandono?
Sorriu... Sorriu para si mesma. Apesar de tudo, ainda valia a pena tentar viver mais um dia...

E ela dormiu...

texto: Ândrea Mamontow

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