25 de novembro de 2010

Nós...



Costumávamos sonhar... de tanto sonhar, perdemo-nos entre sonho e realidade.

Gostariamos de sonhar mais, mas já não nos cabe esse brinquedo pueril: a vida adulta dói, grita e nós temos que obedecer coisas que não gostaríamos... mas tem que ser assim.

Enquanto o sol disputava metáforas abstratas com outros seres alados, nós temíamos não mais correr nos becos e ruas protegidos anonimamente, como gostamos. Mas o sol perdeu e nós continuamos livres. À noite, ainda corremos vestidos apenas de risos e alegrias... nós dançamos tantas danças que os nosso corpos, mesmo cansados, ainda teimam dançar mais e mais... frenéticos, alucinados, inebriados de tanta liberdade que só quem é como nós a sabe sentir... e vivê-la.

Se tu não nos acompanha neste momento é porque a maturidade queimou-lhe uma parte linda da anatomia... nós ainda observamos que aonde se esconde a criança, nós nos escondemos também... disfarçamos várias vezes sermos outra pessoa para que não nos roubem o encanto e a magia de sermos exatamente como queremos ser: livres, libertos, alegres, faceiros, feiticeiros...

Lembra-se de quando tu também eras uma criança como hoje eu sou? Lembra-se de quando tu mentias roubar pedaços de lua pra me ver rir?

Rio eu de ti, hoje...

Tu te tornaste desprezível e vil... querendo roubar de mim risos que não mais pode me oferecer. Se tu estranhas que eu sou nós, é porque eu já morri tantas vezes e ressuscitei tantas vezes que não me enxergo mais eu, apenas "eu"... eu sou "nós": várias "eu" que foram renascendo tantas vezes me mataram. Nós somos fortes e belas... nós somos alegres e jovens... as mortes não nos deram as marcas e sinais no corpo... nós ainda temos aqueles brilhos pueris que transbordam quando estamos plenas... nós não precisamos que o mundo esteja aos nossos pés porque NÓS somos os mundos todos que queremos ter... enxerga-nos assim? Entende-nos?... Cremos que não... e tampouco importa-nos que nos enxergue ou nos entenda... nós continuaremos no caminho profano e sagrado, andando ou voando, mas continuaremos porque temos pressa e fome... o nosso alimento é a vida e custa-nos caro demais.

Se ao me buscar não me encontrares é porque somos EU tantas que não caberemos em teus olhos. E ainda, se tentares nos ferir, ainda assim, não conseguirá: todas as armas e munições são inúteis para quem já morreu tantas vezes e aprendeu a sobreviver de tal maneira que, ao menor toque da morte, já se planta novamente na raiz e começa a renascer.

Nós não tememos dançar em dia de mortos. Também não tememos oscilar nos mastros dos piratas que bradam nos teus pesadelos... E nós, exaustas, ainda conseguimos remar mares e oceanos em busca de outras nós que por ai naufragaram... nós somos tantas, mas tantas que tu não conseguiria amar-nos nem cantar-nos...

Se tu não entendes as nossas sintaxes, nossos morfemas e sememas, se tu não compreendes as nossas figuras semânticas e de linguagem... ainda assim, se tu te assustas com as nossas gravidades obtusas, afasta-se de nós... assim como a esfinge, nós devoraremos qualquer carne que vacilar em nossa frente.

EU somos muitas e você...

Ândrea Mamontow, A Russa.

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